2008-05-27

Parábola da Rotina


Todas as manhãs, de segunda a sexta, um homem passava no seu passo apressado em frente a uma relojoaria. Olhava para o relógio pendurado à porta e acertava por ele o seu relógio de pulso. Lá dentro, o relojoeiro resistiu durante meses a este ritual. Até que um dia, decidiu-se: colocou-se à porta, à espera do transeunte habitual. E, quando ele passava, sem se deter, acertando mais uma vez o relógio enquanto estugava o passo, atirou-lhe:

- Que grande preocupação em andar à hora certa!

O outro retorquiu-lhe:

- Sabe, sou locutor de rádio e, de cinco em cinco minutos eu costumo informar a hora certa aos meus ouvintes, guiando-me pelo meu relógio, pois não me fio muito no que tenho na cabina.

- O relojoeiro disparou em gargalhadas.

- Sabe? Nós costumamos acertar o relógio da porta pelo seu programa de rádio!
”.

Fernando Correia de Oliveira, o autor desta estória – que recolhemos no editorial de “Cronos – Pilares do Tempo”, uma publicação distribuída pelo “Público” (edição de 08/05/12) – observa, à guisa de comentário, que “Esta é, afinal, uma versão do abissus abissum invocat, a parábola dos evangelhos em que um cego guia outros cegos… para o abismo”.

As parábolas são para interpretar livremente. Todavia, se os leitores do JSA nos permitem induzir uma reflexão, sugerimos aos TSA (que exercem a profissão nos Centros de Saúde) que, após a leitura daquele texto, se interroguem sobre a rotina, sobre as actividades de rotina que desenvolvem com o (quase absoluto) convencimento de que estão a trabalhar em Saúde Ambiental…

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ND: abissus abissum invocat, um abismo chama outro.

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Ilustração: Imagem recolhida em Non Liquet

2008-05-26

Centros de Saúde: sem Plano de Emergência


Os bombeiros foram chamados para combaterem um incêndio que teria eclodido num estabelecimento de saúde, num Centro de Saúde. Quando chegaram, a porta estava fechada e não havia ninguém para a abrir.

Os operacionais tiveram que esperar meia hora pela chave. Uma das pessoas que podia abrir as instalações estava ausente e teve que ser o director a interromper uma viagem e voltar à cidade para resolver a situação” – noticia o semanário “O Mirante” (edição de 08/05/15), que acrescenta: - “Por acaso não havia fogo e o fumo que foi avistado por vizinhos devia-se a uma avaria no ar condicionado, mas esta situação veio demonstrar que a falta de planos de emergência das instalações de saúde na região pode ter consequências graves”.

Na região e no país, observamos nós. Que sabemos que serão poucos os Centros de Saúde – Sede e/ou Extensões – que terão Plano de Emergência. E, ainda menos, as unidades de saúde onde se terão realizado simulacros para se avaliar a eficiência dos planos de emergência existentes.

No entanto, nós (MSP e TSA) não nos inibimos de verificar se os estabelecimentos que vistoriamos, particularmente Escolas, Lares e Creches, têm o Plano de Emergência aprovado e testado pela Autoridade Nacional de Protecção Civil.

Porque será?

Decerto que não será por falta de profissionais (de saúde) habilitados. Os TSA, licenciados em Saúde Ambiental, são Técnicos Superiores de Higiene e Segurança no Trabalho…
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Ilustração: Desenho recolhido em Casa do Tinoni

1968, Maio


1968, Maio. Em Paris

A malta, a gente ainda jovem, estudantil, trocou a Universidade e o Liceu pelas ruas. Para se manifestar, sem reivindicações materiais. Por outras formas de ser e de estar, de pensar e de agir. Em democracia, num ambiente de liberdade. Nas ruas, distantes da periferia, dos bidonville dos portugueses emigrantes.

1968, Maio. Na Covilhã

Às escondidas, nós líamos (Jean Paul) Sartre e Simone de Beauvoir, também (Herbert) Marcuse, no original ou numa versão portuguesa em páginas policopiadas em stencil. Cantávamos as cantigas do José Afonso, do Adriano (Correia de Oliveira), do Luís Cília e do Padre Fanhais… Ouvíamos Jacques Brell e a voz onírica de Juliette Gréco – a (eterna) musa de Saint-Germain-des-Prés. Víamos ao filmes censurados de Jean Luc Godard e de outros cineastas da Nouvelle Vague e pela noite sintonizávamos em onda curta as emissões de rádio que de Argel e de Moscovo nos diziam o que se passava em Portugal – no "Portugal Amordaçado", como o Mário Soares escreveria - e em Paris.

Na sub-cave do Hotel Solneve, entre cafés e bagaços, com muitos cigarros, discutíamos o quotidiano, falávamos sobre os livros e os filmes que líamos e víamos. E Escrevíamos. Poemas e pequenos contos que publicávamos nos suplementos juvenis do Diário de Lisboa e do República.

Lembro-me do meu primeiro texto que o Mário Castrim (não me lembro se já com a colaboração da Alice Vieira) seleccionou para a primeira página (ao fundo) de uma das edições do Juvenil do Diário de Lisboa. Chamava-se “O Circo” e acabava com um verso de apelo: - “Por favor, mandem calar os palhaços!”.

1968, Maio

Eu tinha 20 anos.

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Ilustração: Fotografia de Jean-Claude Seine - Journaliste Reporter d'Images

O fio dos dias


Depois de pouco mais de uma semana a eremitar, eis que regresso ao quotidiano. Mas confesso que o tempo foi escasso. Portanto, brevemente – já no próximo mês, em Junho – eu voltarei para o meu retiro. Para continuar a “descoser”. Para prosseguir a aventura de descobrir o fio dos dias.

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Ilustração:In silenzio”, de Alessandra Rosini, quadro recolhido em Artmajeur International

2008-05-16

“Descoser”


Há talvez uma vintena de anos, eu conheci uma jovem, psicóloga, que, nos dias mais cinzentos, frequentava uma modesta sala de costura não para escolher vestuário que lhe abrandasse a agitação da alma mas para – como dizia – “descoser”.

Ao longo dos próximos dias, o JSA será exclusivamente dos leitores. Porque eu, durante cerca de uma semana, estarei algures - distante da Internet e de jornais, longe da rádio e da televisão. Terei comigo alguns livros e alguma música e pelo telefone só estarei disponível para a família. Vou “eremitar”.

"Eremitar", que é outra maneira de "descoser".

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Ilustração: Reprodução deO Grito”, recolhido em Edvard Munch.

2008-05-15

"Portugoal!"


Na segunda-feira (08/05/12), pelas 20.00 horas, nos três canais que emitem em sinal aberto, o telejornal começa com uma transmissão em directo de Viseu. Para a Federação Portuguesa de Futebol anunciar, através do seleccionador, os nomes dos jogadores que participarão num torneio de futebol europeu. Desde então, até a RTP–2 transmite anúncios – provavelmente institucionais – sobre esse torneio de futebol

Tinha razão a Inês Pedrosa, quando, há uns meses, numa sua Crónica Feminina (na revista “Única”, do Expresso) em que glosou o Allgarve do imaginário socialista, sugeriu que Portugal se passasse a chamar “Portugoal”

… Mas eu espero que este país seja sacudido por um sismo ético ou varrido por um tsunami cultural para que se acabe de vez com a alienação futebolística.

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Ilustração: Imagem recolhida em
Laboratório de Desenhos.

Simpósio de Saúde Ambiental

A Escola Superior de Saúde de Beja, com a colaboração da SPSA, Sociedade Portuguesa de Saúde Ambiental, realizará no auditório do IPB, Instituto Politécnico de Beja nos próximos dias 13 e 14 de Junho de 2008 o Simpósio Saúde Ambientali – Inovação em Saúde Ambiental.

O “simpósio não se destina apenas aos estudantes e técnicos de saúde ambiental, já que importa ter reunido o maior número possível de contributos de outros ramos do conhecimento” – porquanto, como justifica a entidade organizadora em Enquadramento e nós aprovamos – “a actuação em saúde ambiental se encontra fortemente mesclada por muitas áreas científicas”.

Aos leitores do JSA, nós suferimos que participem. A inscrição é gratuita.

2008-05-13

Um fontanário



Num tempo em que se reclama a adopção política dos 3Rs, nada de mais sugestivo do que reutilizar os lavatórios abandonados…

Um fontanário em Ameixial, no concelho de Coruche.

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Ilustração: Fotografias por Duarte d’Oliveira (08/05/13)

2008-05-09

Livros


Hoje (08/05/08), a revista Sábado ofereceu aos leitores o romance “Como Água para Chocolate”, de Laura Esquivel. O primeiro de mais um conjunto de livros da Biblioteca Sábado.

O volume foi distribuído gratuitamente. Os próximos serão vendidos por € 1 (um euro), pouco mais do que o preço de um café. São romances cuja qualidade literária é incontestável, de autores reconhecidos, alguns nobelizados.

Na próxima semana, “Pássaros Feridos”, de Colleen McCullough, E nas semanas seguintes, “A Mancha Humana”, de Philip Roth; “Crónica de Uma Morte Anunciada”, de Gabriel García Márquez; “Um Capricho da Natureza”, de Nadine Gordimer

Uma colecção de livros que recomendamos. Aos leitores do JSA.
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Ilustração: Imagem recolhida em FESURV, Universidade de Rio Verde

2008-05-08

Pareceres e/ou Opiniões


Um técnico de uma Câmara Municipal comunicou-nos a dificuldade que sentia para interpretar os Pareceres Sanitários emitidos pelo TSA – com a delegação de competências de Autoridade de Saúde prevista no Artigo 4º do Decreto-Lei Nº 286/99, de 27 de Julho – do Centro de Saúde do concelho. Por uma razão: os Pareceres emitidos pelo TSA começam invariavelmente por “Em princípio (…)”.

Conversámos com o TSA em causa e soubemos que a elaboração dos Pareceres Sanitários obedece a instruções, orientações transmitidas pelo MSP, Autoridade de Saúde do Concelho, que se fundamentam num critério muito mais do que discutível: - “Como a Câmara Municipal é a entidade licenciadora, a entidade que decide, nós não devemos decidir. Portanto, os Pareceres Sanitários começam por “Em princípio…” .

Ora bem. Os Pareceres Sanitários emitidos pela Autoridade de Saúde, se devidamente fundamentados nas disposições legais aplicáveis, têm carácter vinculativo. Todavia, se (e quando) começam por “Em princípio” é inquestionável que não têm consistência formal. Por outras palavras: não são Pareceres mas Opiniões. E, como sabemos, as opiniões (ainda…) não têm valor jurídico.

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Ilustração: Imagem recolhida em
Academia de Ideias.

Coisas da vida


As melhores coisas da vida não são coisas

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Ilustração: Imagem recolhida em Coisas.

2008-05-07

A epidemia da fome


Na edição de 08/05/03, o semanário Expresso anunciou, na primeira página, em parangonas: - “Acabou a comida barata”. E na página 3, das duas dedicada à “Crise alimentar”, o título de um artigo (de Hélder C. Martins) é uma pergunta no mínimo inquietante: - “O pão vai tornar-se um produto de luxo?”.

Na mesma data, sendo “parte integrante da edição do Expresso”, foi distribuído o Nº 70 do jornal de Saúde Pública que – a propósito de Maio, Mês do Coração - propõe, em destaque, também na primeira página: – “Alimente-se bem e cuide do coração”.

Não se trata de criar humor negro, mas, apenas, de estabelecer uma relação de contraste para propormos uma reflexão sobre a prevenção da epidemia da fome. E para adoptarmos outros comportamentos, uma atitude política que radique na solidariedade. Que não se limite ao fim de semana em que decorre mais uma campanha para a angariação de alimentos, promovida pelo Banco Alimentar Contra a Fome, que posteriormente serão distribuídos pela população carenciada através de cerca de 1500 instituições de solidariedade social.

Porque, como disse Lino Maia (Público, edição de 08/05/04), presidente da CNIS, Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade, “contrariamente ao discurso oficial que faz passar a ideia que estamos num país de maravilhas, hoje estamos melhor do que amanhã porque as perspectivas não são nada animadoras”.

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Ilustração: Fotografia recolhida em Cidadão do Mundo.

2008-05-06

"Amapola, lindísima amapola"


Estamos em Maio, o Mês das Flores. Durante o trajecto entre o Centro de Saúde onde trabalho e a minha casa, os terrenos que ladeiam as estradas que percorro estão atapetados por flores silvestres. Muitas flores, sobretudo papoilas.

E enquanto prossigo a viagem, oiço a voz envolvente de Nana Mouskouri dizer-me “Amapola, lindísima amapola / Será siempre tu alma (…)”.

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Ilustração: Fotografia recolhida em
Infojardin .

2008-05-05

Cidadãos anónimos...


Em 8 de Março, vindos de todo o país, mais de 100 000 professores juntaram-se em Lisboa para se manifestarem contra algumas decisões da Ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues. Foi a maior manifestação de professores da história portuguesa.

Por razões discutíveis, uma das participantes foi objecto de fotografias que pelo menos um jornal (Diário de Notícias), uma revista (Visão) e muitos blogues publicaram para ilustrar a Marcha da Indignação.

Menos discutíveis são as razões que motivaram a selecção da fotografia que reproduzimos. Por simples curiosidade, observamos que o manifestante de óculos e de pullover verde é leitor e colaborador do JSA. É de sua autoria a fotografia que ilustra o post que publicámos em 08/02/11. E ao seu lado, ocultada pela bandeira branca, está a mulher – Teresa, irmã do Coordenador do JSA.

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Ilustração: Fotografia recolhida em Fotografia, Sempre!!! .